Por Shand Lenim
Sempre que falamos de gestão e marketing, o clínico de pequenos animais autônomo é posto de lado. Não é difícil encontrar recursos para clínicas, hospitais, pet shops e demais estabelecimentos – mas e quanto ao profissional independente, que frequentemente atende exclusivamente a domicílio e não possui equipe? Há grande carência de informações, e a estrada é longa e árdua até o profissional se sentir seguro para lidar com a clientela.
Na melhor das hipóteses, o médico veterinário aprimora sua técnica e permite-se lamuriar diariamente o azar que enfrenta ao lidar com clientes que não apreciam o seu ofício. Esquece que está sujeito às mesmas regras de percepção que um cliente aplica à uma clínica: ele se importa com a técnica na mesma proporção do atendimento e do visual oferecido pelo médico veterinário. Se ele não enxerga valor nem diferencial, não vai aceitar preços semelhantes ao de uma clínica.
O médico veterinário nesse momento também se esquece de qualquer posicionamento de mercado, querendo atender a todos ao invés de especificar um público e explorar gostos e preferências de seu nicho de escolha.
“Mas vou perder dinheiro se escolher meus clientes!”
E é por isso, senhoras e senhores, que temos tantos veterinários mendigos no mercado.

O médico veterinário independente pode facilmente se sentir uma banda de um homem só.
1. ESCOLHENDO UM NICHO
Seus clientes possuem necessidades diferentes, e perfis demográficos, psicográficos e outros “áficos” igualmente distintos. Contudo, podemos encaixar os clientes em grupos com expectativas e necessidades semelhantes. Expectativa não é “ter alguém a domicílio”, e necessidade também não é “cuidar da saúde do animal”. Tudo isso é subentendido pelo cliente do médico veterinário independente.
Se você fosse um cliente com x nível educacional, y de renda e com um padrão de consumo z, o que você esperaria do serviço de um veterinário autônomo? Portanto, trace um perfil dos diferentes públicos que você já atende, escolha os nichos que você prefere e descubra gostos e preferências deles, como “qual a minha aparência”, “como deve ser meu atendimento”, “o que devo oferecer como meios de pagamento”. Foque em nichos semelhantes, limítrofes – não tente agradar a periferia e o cliente de zona nobre: nenhum deles dará o devido valor ao serviço ao encarar você como um “prestador de serviços veterinários gerais”.
É tentando atender a gregos e troianos que o médico veterinário perde dinheiro, por manter uma superficialidade em todos os seus atendimentos, e raramente uma especificidade a um tipo de público.
Em uma analogia científica, o antibiótico de amplo espectro funciona pouco em uma bactéria de alta especificidade.
2. EMPATIA COM O CLIENTE É NECESSÁRIA
E quando nós, como médicos, somos usados como último recurso para a saúde do animal? E quando o cliente só quer que o problema dele seja resolvido, preferivelmente pelo menor preço?
O cliente, completamente leigo, compartilha da nossa necessidade instintiva de ter um animal de companhia, mas pode não ter a menor idéia de bem-estar animal, ou ter apenas uma noção rudimentar. E para piorar, há os extremos: pode pensar que sabe bem mais do que o médico, ou não estar nem aí porque “bicho é bicho”.
Eis aí a questão da empatia com o cliente. Julgar o cliente não faz parte do jogo. Ser julgado pelo cliente faz parte do jogo, e isso sim acontece o tempo inteiro. Não significa que devamos abaixar a cabeça, mas sim que o tratamento ao cliente deve ser sempre neutro e altamente profissional.
É no momento de desespero do cliente que devemos oferecer compreensão, e mais importante, educação, que fidelizam o cliente. Mas é claro, clientes comprovadamente negligentes, caloteiros ou folgados merecem um capítulo à parte e possuem um perfil independente de nível econômico ou sociocultural.
3. BANDA DE UM HOMEM SÓ
O clínico autônomo é o seu próprio cartão de visitas; a maneira como ele se porta, como trata outras pessoas, como se veste, o que dirige, tudo é analisado pelo cliente, dentro e fora do seu horário de serviço. Isso significa que o cliente não sabe distinguir indivíduo de profissional.
Assim, um médico veterinário independente equivale a uma empresa, e em essência é: ele precisa demonstrar acessibilidade, preço, competência e visual. É fácil se sentir uma banda de um homem só diante de tantas responsabilidades.

A empresa de óticas holandesa Oogmerk ilustrou de maneira divertida a diferença que um mero acessório pode fazer.
Entende-se por acessibilidade a facilidade de entrar em contato com o profissional, e a frequência com que o próprio profissional busca contato com seus clientes. Você tem site? Ele atende ao seu nicho? Seus contatos são facilmente acessíveis no Google? Você atende seu telefone? Como e quando você atende seu telefone? Tudo isso deve estar de acordo com o seu nicho.
O preço é um posicionamento de mercado diretamente dependente da sua clientela. Se você atende proprietários de renda elevada, e todo o seu serviço é voltado para essa classe, naturalmente você pode cobrar mais caro. Se você atende proprietários de menor renda, você cobrará um preço acessível e que valorize o seu serviço – não dispute clientes por preço jamais, por ser uma batalha onde todos saem perdendo: você, seu concorrente, a classe e principalmente seu cliente e paciente.
A competência é sempre valorizada e admirada, mas dificilmente é o parâmetro de escolha do cliente, que subentende a capacidade técnica e não tem meios de diferenciar profissionais experientes de inexperientes. Por isso, não pense que você será escolhido apenas pelos seus títulos, ou que o cliente tolerará um mau atendimento por causa deles. Para cada treinamento de nível técnico que você fizer, outro deve ser feito para a venda do seu serviço.
O visual também depende diretamente do seu público, mas há um “mínimo denominador comum”: barba por fazer, roupa amassada, cabelo desgrenhado, mau hálito, odores fortes, unhas, tudo isso, embora óbvio, deve fazer parte de uma lista a ser conferida antes de qualquer visita. Uma imagem pessoal que transmite desleixo não inspira confiança em ninguém. Outros exemplos: roupas amarrotadas, sem corte e/ou ferindo o contexto profissional; higiene pessoal deficiente ou exagerada (maquiagem pesada demais, perfume forte; cabelos compridos oleosos/soltos/desgrenhados; unhas descascando ou sujas); calçados e jalecos sujos. Tatuagens, piercings e bodymods são assunto delicado em alguns nichos, outros realmente não se importam ou até se identificam.
Ainda sobre desleixo, o mesmo se diz do automóvel de um profissional autônomo, que de muitas formas o representa. Profissionalmente, o que importa não é tanto o modelo ou cor, mas o asseio e características de personalização. Um automóvel sujo, com papéis jogados no banco de trás, e com pedaços batidos ou quebrados inspiraria a sua confiança no profissional dono dele? E que tal um automóvel com som alto, excesso de adesivos ou adereços e suspensão rebaixada? Com certeza há um nicho para veterinários desse tipo, mas que provavelmente não trará grande retorno pessoal ou financeiro.
4. BUSQUE O DIFERENCIAL NO ATENDIMENTO
O que você pode oferecer para a sua clientela que outros não oferecem? Talvez você seja mais atencioso; talvez lembre-se de datas especiais de clientes e pacientes; talvez seja mais carinhoso com os pacientes. Talvez seja rápido e seco, talvez seja mais devagar e se prolongue em conversas com o proprietário, não importa: busque adaptar seu atendimento ao seu nicho, procure saber o que seus clientes preferem e antecipe-se.
5. FIM?
É frequente encontrar autônomos que reclamam que “não está fácil para ninguém”. Mas será que esses profissionais realmente estudam o cliente da mesma forma que estudam o paciente? Muito da qualidade de vida de um médico veterinário pode ser resolvido ao buscarmos conhecer melhor clientes antigos, inovar no atendimento e oferecer o máximo de profissionalismo possível.
Claro que devemos manter limites, e não devemos submeter todos os aspectos de nosso atendimento à mercê do cliente. Mas ao investirmos ao menos um pouco para conhecê-lo, certamente nosso futuro profissional pode dar um grande salto para melhor.

Shand Lenim é médico veterinário, CRMV DF 2715, e diretor do blog Animal Marketing.